Cansaço mental: Desculpa esfarrapada ou realidade?

- Estou cansada!
- Cansada do quê? Tu não fazes nada!

Esta conversa soa-te familiar? Muitas vezes, nós pessoas com deficiência queixamo-nos de um cansaço a nível mental que algumas pessoas têm dificuldade em compreender. Geralmente associam o acto de nos cansarmos a algo físico, daí ficarem um pouco surpreendidas, pois na sua perspectiva temos uma rotina ou trabalho pouco agitados nesse sentido.


Afinal o que nos cansa mentalmente?

Se alguém tem uma deficiência, isso significa que a pessoa tem um défice ou seja existem certas tarefas, movimentos ou até sentidos que exigem esforço e que não acontecem em piloto automático como no caso de uma pessoa sem deficiência. E é precisamente esse esforço extra ao longo de horas, dias que nos cansa. Além disso, a deficiência é apenas uma pequena percentagem do cansaço no nosso dia-a-dia, temos também uma vida pessoal e profissional, gerir isso em conjunto por vezes é bem desafiante. Já para não falar dos estímulos,  informação que temos ao nosso redor e que dificultam o foco. Estamos numa era em que o trabalho criativo ou ligado ao atendimento ao público também desgasta o nosso cérebro.

Mas neste artigo, vamos focarmo-nos no cansaço mental associado aos nossos défices.


Os surdos ouvem com o corpo todo

(Imagem Ilustrativa)
Rapaz com chapéu e aparelho auditivo // Foto: TH Team - Pexels

Imagina que estás num restaurante, a jantar com mais duas pessoas. Atrás de ti está um casal tagarela. Se tu não tiveres nenhum défice auditivo, provavelmente consegues desligar-te com facilidade das conversas à tua volta e concentrar-te só nas pessoas que estão na tua mesa e manter uma conversa com elas.
Para uma pessoa com perda auditiva, não é tão simples. 
 

Ela precisa de fazer um esforço acrescido para se "concentrar" e ouvir. Pode usar estratégias como: olhar para os lábios, fazer leitura labial, observar a expressão facial ou postura corporal da pessoa. Isso num ambiente silencioso, por vezes é desafiante. Imagina agora num restaurante, com ruídos e com duas pessoas a falar com ela. Tem de duplicar o seu esforço e há certos detalhes que podem atrapalhar: Interrupções, garrafas a tapar a visibilidade da cara dos seus amigos, a velocidade com a qual eles falam. Coisas simples como usar bigode, mastigar uma pastilha, ter falta de dentes, algum sotaque ou estar num ambiente com pouca luz podem dificultar a leitura labial.

É caso para dizer que "os surdos ouvem com o corpo todo".

No final do dia, o resultado pode ser uma valente dor de cabeça ou um cansaço a nível mental semelhante ao que se sente como se estivéssemos estado a estudar para um exame.

Esse cansaço varia consoante o grau e tipo de surdez, contexto, a forma como gere a sua energia, descanso e se usa ou não alguma tecnologia para ouvir.

Existem aparelhos auditivos ou implantes cocleares com programas de som para diversos contextos (café, música, etc), mas temos de ser nós a perceber qual a situação adequada para trocar o programa ou até ajustar algumas definições de som (volume, sensibilidade, etc).

Outros exemplos que também podem afectar pessoas com deficiência e contribuir para o cansaço mental

No caso de uma pessoa com mobilidade reduzida e que necessita de cadeira de rodas para se deslocar, ela precisa de planear o trajecto ou do lugar onde vai estacionar (se conduzir), pois nem todos os locais são acessíveis. Além disso, pisos irregulares como calçadas também podem cansar a pessoa, porque faz com que batam com a cabeça no encosto da cadeira e as deslocações se tornem desconfortáveis.


(Imagem Ilustrativa)
Rapaz com mobilidade reduzida em dia de chuva // Foto:  Aleksey Nosov - Pexels


Resumindo...

Quando alguém nos diz que está cansado, há tendência a julgamentos e críticas, contudo há que relembrar que a nossa realidade é diferente da outra pessoa.
Este tipo de situações podem ser uma oportunidade de não criticarmos logo e ter um bocado de empatia ou curiosidade em relação a outras realidades. Em vez disso, fazer perguntas para compreender melhor os desafios ou rotina da pessoa e como funciona o seu défice. Existem coisas que conseguimos fazer em piloto automático ou que achamos até bastante fáceis, mas que para outras pessoas não é bem assim. 

E tu? Costumas sentir cansaço mental?

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